Data da abolição é dia de resistência e combate à injustiça

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Movimentos negros e entidades sindicais não comemoram a Lei Áurea por entenderem que seu alcance não passa do discurso oficial

O fim da escravidão, em 1888, é comemorado oficialmente pelo Estado brasileiro e, apesar de decretada no Império, é efusivamente comemorada como uma conquista do movimento republicano. Mas, segundo o secretário de Combate ao Racismo da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), Almir Aguiar, na verdade, era o sistema liberal internacional, liderado pela Inglaterra, que pressionava o Brasil, a promover o trabalho assalariado e ampliar seu mercado consumidor.

“Foi um jogo de cena, no qual a ‘bela’ princesa Isabel, numa atitude majestosa e sublime, ‘encerrou’ séculos de opressão contra negros e negras”, afirmou o dirigente da Contraf-CUT.

Segundo ele, pelas pessoas escravizadas, africanas e africanos sequestrados de sua terra e seus descendentes já nascidos aqui, a alardeada Lei Áurea não fez nada. “Nenhuma linha da Lei garantiu qualquer direito a essa população. Nada para que eles pudessem ter qualquer meio de sobrevivência”, observou.

A medida da monarquia, que se esgotava, apenas lançou os negros e negras, crianças, jovens ou idosos, apenas com a roupa do corpo, para fora das propriedades a que serviram por séculos, para que então passassem a ser vítimas do mais agressivo tipo de racismo social.

Dia de luta

É com esses argumentos bastante sólidos que os movimentos negros e sindicais rejeitam o 13 de Maio como uma data a ser comemorada. Antes, deve ser um dia de luta, resistência, reflexão, conscientização e denúncia de tamanha injustiça histórica. Para a secretária de Combate ao Racismo da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Anatalina Lourenço, trata-se de um “dia de rememorar e mais um dia de denúncia contra o racismo e contra os mecanismos que submetem a população negra às piores condições de vida possíveis”.

Em reportagem do site da CUT, Anatalina aponta aspectos do racismo estrutural no Brasil, que só se acentua ao longo dos anos. Entre os mais graves, está o fato de que trabalhadores negros e negras recebem salário menor pela mesma atividade realizada por trabalhadores brancos, além de serem postos em situações mais precárias e serem as maiores vítimas do desemprego, numa proporção 71% maior do que a que afeta a população branca.

Na sociedade

As consequências da discriminação estrutural são igualmente sensíveis em todos os setores da sociedade brasileira. Estudo realizado recentemente pela CUT e pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômico (Dieese), por exemplo, mostrou que mais de 61% dos entregadores e entregadoras, hoje vistos como os trabalhadores em situação das mais precárias no país, são negros e negras.

O estudo também aponta a exclusão de políticas sociais, como saúde e educação, bem como serviços básicos, como saneamento, é mais aguda contra essa população. Outro caso gritante encontra-se nos campi universitários, onde apenas 34% dos estudantes se declaram pretos ou pardos (terminologia usada pelo IBGE), enquanto 55% da população do país, ou a maioria incontestável, é negra.

História tendenciosa

Para o secretário de Combate ao Racismo da Contraf-CUT, o racismo busca promover um “apagamento histórico”. Para ele, trata-se de uma escandalosa tentativa de ocultar feitos de personalidades pelo fato de elas serem negras. No artigo “13 de Maio: a história não contada”, publicado no site da CUT Nacional, Almir lista uma série de pessoas que o discurso oficial despreza ou quer esconder, por questões raciais.

Em seu texto, Almir, que também é militante do Movimento Negro Unificado (MNU), denuncia que o Brasil “carrega na hegemonia de suas oligarquias, o ranço da Casa Grande e da Senzala, onde a chamada ‘democracia racial’ jamais existiu, visto que até a miscigenação foi resultado de violência, estupros e dor”. E, “essa herança racista faz com que a historiografia ensinada nas escolas omita as personagens negras de destaque na história, na cultura e na formação civilizatória brasileira, reduzindo a presença negra ao período da escravidão”.

Não são poucos os nomes desrespeitados ou esquecidos de propósito. Ele elenca, “além de Zumbi dos Palmares, figuras como Tereza de Benguela, Dandara, Aqualtune Ezgondidu Mahamud da Silva Santos, Francisco José do Nascimento (também conhecido como Dragão do Mar ou Chico da Matilde), Carolina Maria de Jesus, Arthur Bispo do Rosário, Esperança Garcia, André Rebouças, o médico Juliano Moreira, Clementina de Jesus e Abdias Nascimento”.

“São nomes que a esmagadora maioria dos estudantes brasileiros, mesmo de nível superior, desconhece”, observou Almir. Segundo ele, muitos não têm noção “da contribuição que este panteão afrodescendente deu ao nosso país”.

O artigo do dirigente da observa que o descaso no registro histórico também se estende aos fatos. Como é o caso da primeira greve no Brasil. A maioria dos livros indica que ela teria ocorrido em 1917, organizada pelos movimentos comunista e anarquista, para esconder a chamada “greve negra”, ocorrida 60 anos antes, ressalta o texto.

Almir entende que o resgate da participação da comunidade negra na história brasileira deve ser parte decisiva do combate ao racismo e à discriminação. Em especial neste momento de crise social por que passa o país. Trata-se de “um aspecto fundamental para a luta pela igualdade racial, especialmente, em um tempo de tantos retrocessos, em que a extrema direita faz a apologia do racismo”. Para ele, “recontar a história é preciso, porque não haverá emancipação do povo brasileiro sem a emancipação das comunidades negras”.

Fonte: Contraf-Cut

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